A Grécia do
Período Clássico (V a.C. – IV a.C.) foi marcada por guerras entre gregos e
povos vizinhos e também entre os próprios gregos. Atenas, que era a
cidade-Estado mais próspera, passou a ser dominada por sua rival Esparta e
depois pelos macedônios. Foi neste contexto de apogeu e decadência que a
filosofia deixou de se preocupar com o mundo exterior e passou a ter o homem
como sua principal questão de reflexão. Iniciava-se, assim, a escola socrática.
·
A filosofia
pensando sobre o homem
Sócrates (470 a 399 a.C.) viveu em
Atenas, onde assistiu ao apogeu e à decadência da democracia. Filho de uma
parteira e de um escultor, o pensador teve a oportunidade de conhecer a obra de
Homero, além de dominar as doutrinas de Parmênides, Zenão e Heráclito.
À época de
Sócrates, havia em Atenas um movimento cultural promovido pelos sofistas (“sábios”),
entre eles, Górgias (485 a 380 a.C.) e Protágoras (485 a 411 a.C.), cuja
principal característica era a preocupação intelectual de como obter um
raciocínio melhor. Este objetivo vinha ao encontro das necessidades dos atenienses,
que, durante o século V a.C. tinham como regime de governo a democracia, na
qual os cidadãos (homens atenienses com mais de 21 anos) deviam participar das
discussões e decisões de poder. Os sofistas ensinavam aos cidadãos as técnicas
da retórica e da persuasão, ou seja, ensinavam seus alunos a falar bem e usar
essa fala para convencer seus interlocutores, afirmando serem estes os instrumentos
fundamentais do conhecimento. Note que a preocupação dos sofistas estava
centrada na figura humana, e não na natureza. Protágoras chegou o afirmar que
“o homem é a medida de todas as coisas”.
O grande objetivo dos sofistas não era
afirmar categoricamente algo, mas fazer com que os outros concordassem com eles
por meio de seus argumentos; daí a importância que a palavra tinha no meio
sofístico. Mesmo porque as decisões dentro da sociedade democrática grega, e mais
especificamente da sociedade ateniense, eram tomadas dentro da Assembleia de
cidadãos que acontecia na Ágora, como se viu anteriormente.
Os sofistas podem ser identificados
como os primeiros cidadãos responsáveis por educar outros cidadãos e por buscar
aperfeiçoar do discurso e raciocínio daqueles que se dispusessem a pagá-los. O
fato de serem remunerados era, aliás, um dos pontos da crítica que partia de Sócrates.
De forma geral, os sofistas se destacam por relativizar o conhecimento,
situação esta que, parcialmente, está relacionada à multiplicidade de
explicações dadas pelos pré-socráticos para a existência do todo ao nosso
redor.
Assim, a base do relativismo sofista
encontra-se nos trabalhos categóricos e contrários aos estabelecidos pelos
chamados pré-socráticos ou físicos. Essas variadas explicações levavam os
sofistas a recusar a investigação filosófica pré-socrática por acreditarem que
o conhecimento
absoluto não era
uma possibilidade, por isso voltavam sua atenção para o homem. Acrescente-se a
isso os contatos que os gregos estabeleceram com outros povos no período, que
levaram os sofistas a perceberem as variações de leis, costumes e ideias dos
outros povos e a entendê-las como indicativas do estabelecimento de convenções
entre homens, e não como obra da natureza. Se tudo do universo dos homens é por
convenção, onde está a verdade? Tudo depende, então, da argumentação, do
convencimento. Assim, no universo do homem o importante é a opinião (doxa),
e não a verdade
(alétheia).
Os sofistas, portanto, não buscavam a
verdade, pois, de acordo com sua percepção, era impossível chegar a ela; daí
sua crença de que o único caminho possível era o da disputa verbal e o da
vitória sobre os adversários, para mostrar como seus argumentos eram melhores
do que os
deles.
Entretanto, Sócrates acabou rompendo
com este grupo por não aprovar a filosofia como instrumento de retórica e
persuasão política para os cidadãos que podiam pagar por tal conhecimento. Para
ele, a Filosofia era, por excelência, uma reflexão profunda de conceitos tidos
como inquestionáveis: a coragem, a justiça, a sabedoria, entre outros. Era
preciso combater as opiniões originárias do senso comum para se obter o verdadeiro
conhecimento.
·
A
filosofia socrática
De que maneira o homem pode atingir o
verdadeiro conhecimento foi a grande meta deste pensador ateniense.
A missão socrática de revelar a
verdade através da discussão filosófica foi afirmado por Sócrates após sua ida
ao oráculo de Delfos. Na entrada do templo, encontrava-se escrita a frase “Conhece-te
a ti mesmo”, a qual ele julgou ter sido escrita para ele mesmo, revelando-se
como o desejo de Apolo que Sócrates deveria cumprir: conhecer a si mesmo e
fazer com que os demais cidadãos atenienses também se conhecessem. Para tanto,
seria necessário que cada indivíduo tivesse condição de se livrar das falsas
verdades, criadas a partir das opiniões que, por sua vez, apoiavam-se em
percepções distorcidas da realidade. Percebemos, então, um dos motivos que
levou boa parte dos cidadãos atenienses a se indispor com Sócrates, pois as
questões que este filósofo lhes dirigia os desconcertavam, fazendo-os entrar em
contradição e, assim, acompanhar a argumentação socrática com atenção, na mesma
medida em que respondiam às dúvidas do filósofo; tais respostas, não raro,
sempre acabavam por levar o interlocutor a concordar com os argumentos de
Sócrates, dando-lhe razão. Daí a insatisfação entre os cidadãos, que decidiam o
destino da cidade, pois suas palavras e discursos, como o dos sofistas,
pautavam-se exclusivamente em opiniões desprovidas de profundidade, a qual era exigida
pelo pensamento socrático. Em suma, a diferença entre as ideias sofistas e o
discurso filosófico socrático encontra-se no rigor em que se expressa este
último, pois o exercício do diálogo e o esclarecimento sobre os preconceitos do
discurso sofista indicavam um caminho no sentido do conhecimento, das razões do
mundo, da verdade.
A filosofia de Sócrates era
desenvolvida mediante diálogos críticos com seus interlocutores, divididos em
dois momentos básicos: a ironia (do grego eironeia, “perguntar fingindo
ignorar”) e a maiêutica (do grego maieutiké, a “arte do parto”). O método
consistia em, por meio do diálogo, fazer um interlocutor discorrer sobre
determinado assunto que ele acreditasse dominar, para dirigi-lo à contradição e
demonstrar sua real ignorância sobre o assunto referido. Sócrates não enunciava
teorias, mas fazia perguntas e analisava respostas sucessivamente, mostrando a
seu interlocutor as contradições daquilo que estava falando. A única afirmação
com certeza que ele fazia era: “só sei que nada sei”. Dessa maneira, Sócrates
procurava mostrar para seu interlocutor o quanto “pensamos” que sabemos,
quando, na verdade, sabemos muito pouco. Não interessa se falamos bonito, mas
se sabemos sobre o que estamos falando. Assim, a questão do conhecimento
passava a ser o próprio ser humano.
Não é Sócrates quem afirma a
ignorância do interlocutor, mas é este mesmo quem a percebe ao se deixar
convencer pelos argumentos socráticos formados a partir de suas próprias
constatações. Dessa forma, a percepção da própria ignorância funciona como
elemento catártico que permite ao indivíduo redescobrir-se (“conhece-te a ti
mesmo”), princípio a partir do qual ele estaria pronto para encontrar a
verdade. A maiêutica, assim, corresponde ao ofício do filósofo como parteiro do
conhecimento, pois dessa forma o conhecimento vem à luz. A prática do filósofo
é aquela que coloca o homem que deseja saber em aporias. A aporia é uma
autocontradição. O método apo- rético de Sócrates pressupõe a purificação da
falsa sophia do interlocutor.
A prática de redescobrir-se conduziria
o homem em direção ao conhecimento e à verdade, domínio do inteligível que
corresponde às ideias purificadas de todo elemento sensível. No domínio do
inteligível, encontra-se a ideia suprema do bem, motivo pelo qual torna-se
natural que o homem o pratique, em benefício de si mesmo e dos outros. Dessa
forma, ele estaria sendo um homem virtuoso e ético. Sócrates, ao convidar o
homem a agir dessa forma, comprometendo-se com a ética e a verdade, desagradava
a muitos, pois esta não era uma atitude comum na época. Sócrates não escreveu
sobre suas ideias e experiências filosóficas, mas teve discípulos importantes
que continuaram sua obra, como Xenofonte e Platão. Este último escreveu toda
sua obra filosófica em forma de diálogos, assim como o método de seu mestre, e
a maior parte do que conhecemos sobre o pensamento de Sócrates chegou aos
nossos dias através das obras de Platão.
Por causa de seu método e pela forma
como o utilizava, questionando tanto mendigos como poderosos proprietários,
Sócrates foi condenado à morte pelas autoridades políticas de Atenas. Mesmo
conseguindo mostrar o absurdo das acusações que lhe foram feitas, de que ofendia
os deuses e corrompia a juventude, Sócrates não fugiu de sua pena de morte, por
achar que a lei era soberana e que não podia negar tudo o que tinha defendido
ao longo de sua vida. Rodeado por seus discípulos, Sócrates morreu ingerindo um
cálice de cicuta.
Entendimento do texto
1.
Quem
eram os sofistas?
2.
Indique
e explique o principal objetivo dos sofistas.
3.
Explique
a base do relativismo sofista.
4.
Explique
as seguintes frases referentes ao pensamento socrático:
a)
“Conhece-te
a ti mesmo”.
b)
“Só
sei que nada sei”.
5.
Explique
o episódio do oráculo de Delfos.
6.
Explique
as críticas de Sócrates aos sofistas.
7.
Explique
o método socrático.
8.
Explique os motivos que levaram à condenação
de Sócrates.
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