domingo, 7 de dezembro de 2014

A questão do conhecimento na Grécia Antiga


            A Grécia do Período Clássico (V a.C. – IV a.C.) foi marcada por guerras entre gregos e povos vizinhos e também entre os próprios gregos. Atenas, que era a cidade-Estado mais próspera, passou a ser dominada por sua rival Esparta e depois pelos macedônios. Foi neste contexto de apogeu e decadência que a filosofia deixou de se preocupar com o mundo exterior e passou a ter o homem como sua principal questão de reflexão. Iniciava-se, assim, a escola socrática.

·         A filosofia pensando sobre o homem

      Sócrates (470 a 399 a.C.) viveu em Atenas, onde assistiu ao apogeu e à decadência da democracia. Filho de uma parteira e de um escultor, o pensador teve a oportunidade de conhecer a obra de Homero, além de dominar as doutrinas de Parmênides, Zenão e Heráclito.
À época de Sócrates, havia em Atenas um movimento cultural promovido pelos sofistas (“sábios”), entre eles, Górgias (485 a 380 a.C.) e Protágoras (485 a 411 a.C.), cuja principal característica era a preocupação intelectual de como obter um raciocínio melhor. Este objetivo vinha ao encontro das necessidades dos atenienses, que, durante o século V a.C. tinham como regime de governo a democracia, na qual os cidadãos (homens atenienses com mais de 21 anos) deviam participar das discussões e decisões de poder. Os sofistas ensinavam aos cidadãos as técnicas da retórica e da persuasão, ou seja, ensinavam seus alunos a falar bem e usar essa fala para convencer seus interlocutores, afirmando serem estes os instrumentos fundamentais do conhecimento. Note que a preocupação dos sofistas estava centrada na figura humana, e não na natureza. Protágoras chegou o afirmar que “o homem é a medida de todas as coisas”.
       O grande objetivo dos sofistas não era afirmar categoricamente algo, mas fazer com que os outros concordassem com eles por meio de seus argumentos; daí a importância que a palavra tinha no meio sofístico. Mesmo porque as decisões dentro da sociedade democrática grega, e mais especificamente da sociedade ateniense, eram tomadas dentro da Assembleia de cidadãos que acontecia na Ágora, como se viu anteriormente.
         Os sofistas podem ser identificados como os primeiros cidadãos responsáveis por educar outros cidadãos e por buscar aperfeiçoar do discurso e raciocínio daqueles que se dispusessem a pagá-los. O fato de serem remunerados era, aliás, um dos pontos da crítica que partia de Sócrates. De forma geral, os sofistas se destacam por relativizar o conhecimento, situação esta que, parcialmente, está relacionada à multiplicidade de explicações dadas pelos pré-socráticos para a existência do todo ao nosso redor.
    Assim, a base do relativismo sofista encontra-se nos trabalhos categóricos e contrários aos estabelecidos pelos chamados pré-socráticos ou físicos. Essas variadas explicações levavam os sofistas a recusar a investigação filosófica pré-socrática por acreditarem que o conhecimento
absoluto não era uma possibilidade, por isso voltavam sua atenção para o homem. Acrescente-se a isso os contatos que os gregos estabeleceram com outros povos no período, que levaram os sofistas a perceberem as variações de leis, costumes e ideias dos outros povos e a entendê-las como indicativas do estabelecimento de convenções entre homens, e não como obra da natureza. Se tudo do universo dos homens é por convenção, onde está a verdade? Tudo depende, então, da argumentação, do convencimento. Assim, no universo do homem o importante é a opinião (doxa),
e não a verdade (alétheia).
      Os sofistas, portanto, não buscavam a verdade, pois, de acordo com sua percepção, era impossível chegar a ela; daí sua crença de que o único caminho possível era o da disputa verbal e o da vitória sobre os adversários, para mostrar como seus argumentos eram melhores do que os
deles.
   Entretanto, Sócrates acabou rompendo com este grupo por não aprovar a filosofia como instrumento de retórica e persuasão política para os cidadãos que podiam pagar por tal conhecimento. Para ele, a Filosofia era, por excelência, uma reflexão profunda de conceitos tidos como inquestionáveis: a coragem, a justiça, a sabedoria, entre outros. Era preciso combater as opiniões originárias do senso comum para se obter o verdadeiro conhecimento.

·        A filosofia socrática

     De que maneira o homem pode atingir o verdadeiro conhecimento foi a grande meta deste pensador ateniense.
        A missão socrática de revelar a verdade através da discussão filosófica foi afirmado por Sócrates após sua ida ao oráculo de Delfos. Na entrada do templo, encontrava-se escrita a frase “Conhece-te a ti mesmo”, a qual ele julgou ter sido escrita para ele mesmo, revelando-se como o desejo de Apolo que Sócrates deveria cumprir: conhecer a si mesmo e fazer com que os demais cidadãos atenienses também se conhecessem. Para tanto, seria necessário que cada indivíduo tivesse condição de se livrar das falsas verdades, criadas a partir das opiniões que, por sua vez, apoiavam-se em percepções distorcidas da realidade. Percebemos, então, um dos motivos que levou boa parte dos cidadãos atenienses a se indispor com Sócrates, pois as questões que este filósofo lhes dirigia os desconcertavam, fazendo-os entrar em contradição e, assim, acompanhar a argumentação socrática com atenção, na mesma medida em que respondiam às dúvidas do filósofo; tais respostas, não raro, sempre acabavam por levar o interlocutor a concordar com os argumentos de Sócrates, dando-lhe razão. Daí a insatisfação entre os cidadãos, que decidiam o destino da cidade, pois suas palavras e discursos, como o dos sofistas, pautavam-se exclusivamente em opiniões desprovidas de profundidade, a qual era exigida pelo pensamento socrático. Em suma, a diferença entre as ideias sofistas e o discurso filosófico socrático encontra-se no rigor em que se expressa este último, pois o exercício do diálogo e o esclarecimento sobre os preconceitos do discurso sofista indicavam um caminho no sentido do conhecimento, das razões do mundo, da verdade.
    A filosofia de Sócrates era desenvolvida mediante diálogos críticos com seus interlocutores, divididos em dois momentos básicos: a ironia (do grego eironeia, “perguntar fingindo ignorar”) e a maiêutica (do grego maieutiké, a “arte do parto”). O método consistia em, por meio do diálogo, fazer um interlocutor discorrer sobre determinado assunto que ele acreditasse dominar, para dirigi-lo à contradição e demonstrar sua real ignorância sobre o assunto referido. Sócrates não enunciava teorias, mas fazia perguntas e analisava respostas sucessivamente, mostrando a seu interlocutor as contradições daquilo que estava falando. A única afirmação com certeza que ele fazia era: “só sei que nada sei”. Dessa maneira, Sócrates procurava mostrar para seu interlocutor o quanto “pensamos” que sabemos, quando, na verdade, sabemos muito pouco. Não interessa se falamos bonito, mas se sabemos sobre o que estamos falando. Assim, a questão do conhecimento passava a ser o próprio ser humano.
         Não é Sócrates quem afirma a ignorância do interlocutor, mas é este mesmo quem a percebe ao se deixar convencer pelos argumentos socráticos formados a partir de suas próprias constatações. Dessa forma, a percepção da própria ignorância funciona como elemento catártico que permite ao indivíduo redescobrir-se (“conhece-te a ti mesmo”), princípio a partir do qual ele estaria pronto para encontrar a verdade. A maiêutica, assim, corresponde ao ofício do filósofo como parteiro do conhecimento, pois dessa forma o conhecimento vem à luz. A prática do filósofo é aquela que coloca o homem que deseja saber em aporias. A aporia é uma autocontradição. O método apo- rético de Sócrates pressupõe a purificação da falsa sophia do interlocutor.
     A prática de redescobrir-se conduziria o homem em direção ao conhecimento e à verdade, domínio do inteligível que corresponde às ideias purificadas de todo elemento sensível. No domínio do inteligível, encontra-se a ideia suprema do bem, motivo pelo qual torna-se natural que o homem o pratique, em benefício de si mesmo e dos outros. Dessa forma, ele estaria sendo um homem virtuoso e ético. Sócrates, ao convidar o homem a agir dessa forma, comprometendo-se com a ética e a verdade, desagradava a muitos, pois esta não era uma atitude comum na época. Sócrates não escreveu sobre suas ideias e experiências filosóficas, mas teve discípulos importantes que continuaram sua obra, como Xenofonte e Platão. Este último escreveu toda sua obra filosófica em forma de diálogos, assim como o método de seu mestre, e a maior parte do que conhecemos sobre o pensamento de Sócrates chegou aos nossos dias através das obras de Platão.
       Por causa de seu método e pela forma como o utilizava, questionando tanto mendigos como poderosos proprietários, Sócrates foi condenado à morte pelas autoridades políticas de Atenas. Mesmo conseguindo mostrar o absurdo das acusações que lhe foram feitas, de que ofendia os deuses e corrompia a juventude, Sócrates não fugiu de sua pena de morte, por achar que a lei era soberana e que não podia negar tudo o que tinha defendido ao longo de sua vida. Rodeado por seus discípulos, Sócrates morreu ingerindo um cálice de cicuta.

Entendimento do texto

1.      Quem eram os sofistas?

2.      Indique e explique o principal objetivo dos sofistas.

3.      Explique a base do relativismo sofista.

4.      Explique as seguintes frases referentes ao pensamento socrático:

a)      “Conhece-te a ti mesmo”.

b)      “Só sei que nada sei”.

5.      Explique o episódio do oráculo de Delfos.

6.      Explique as críticas de Sócrates aos sofistas.

7.      Explique o método socrático.

8.       Explique os motivos que levaram à condenação de Sócrates.

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